Uma breve análise sobre a criação de uma Força Espacial por Trump e seus possíveis desdobramentos

Volume 5  |  Número 49  |  Jun. 2018

Por Caroline Rocha Travassos Colbert 
FONTE DA IMAGEM: SAPOTEK

A preocupação dos Estados Unidos em relação à segurança de seus satélites levou Senado a iniciar em agosto de 2017, uma proposta de criação de uma legislação que orientaria o Departamento de Defesa a construir um novo “Corpo Espacial” dentro da Força Aérea. Mesmo rejeitada pelo congresso norte-americano logo em novembro, este projeto despertou entre os republicanos um senso de necessidade de investimento no setor militar espacial. 
Os defensores de um Space Corps afirmavam que o Pentágono seria o culpado por não ter priorizado a segurança espacial nos últimos anos, e essa desatenção teria dado aos russos e chineses oportunidades de alcançar a superioridade militar norte-americana. Um dos principais opositores a esta proposta foi o próprio Exército, que argumentou que o Congresso deveria apoiar o envio de mais recursos para a Força Aérea ao invés de força-los a iniciar um Corpo Espacial, o que geraria mais burocracia em tempos de guerra (BERMAN, 2017). 
As mudanças que emergiram deste acordo entre o Senado e o Congresso habilitariam o Comando Espacial da Força Área como “a única autoridade para organizar, treinar e equipar” todas as forças espaciais da Força Aérea, cedendo ao Comando Espacial uma autonomia maior, mesmo ainda pertencendo à U.S Air Force (USAF). Também transforma o Operationally Responsive Space Office em Space Rapid Capabilities Office reportando-se diretamente ao Comando Espacial da Força Aérea (HARRISON, 2017). Esta resolução deu mais responsabilidade e autoridade ao Comando Espacial da Força Aérea por aquisições espaciais, gerenciamento de recursos, requisitos, combate de guerra e desenvolvimento de pessoal, ou seja, mais autonomia dentro da USAF e a possibilidade de construção de um quadro espacial mais forte com o objetivo de operar independentemente no futuro (ERWIN, 2017). 
Sabe-se que os Estados Unidos (assim como todos os países) tornaram-se mais dependentes das tecnologias espaciais, sendo aplicadas através do transporte, saúde, meio ambiente, telecomunicações, educação, comércio, agricultura, energia e operações militares (KLEIN, 2006). Portanto, perante um ataque de forças inimigas, a interceptação dos satélites de telecomunicação ou de operações militares, por exemplo, deixaria os norte-americanos em situação de caos em diversas áreas das quais necessitam desta tecnologia. 
Valendo-se destes argumentos e de que a competição espacial está se tornando cada vez mais iminente, Trump aprovou uma nova Estratégia Nacional Espacial, anunciada em março deste ano pela Casa Branca. O documento ainda não foi divulgado, mas em nota a declaração indica que a estratégia pretende descrever como a administração protegerá os interesses americanos no espaço, ajustando-se a um tema mais amplo de políticas empreendidas sob o lema da “América Primeiro” pela administração atual (WHITE HOUSE, 2018). 
Em seu discurso proferido na Casa Branca, no dia 18 de junho deste ano [1], Trump deixou a imprensa mundial especulando demasiadamente sobre a criação de uma Força Espacial, mas pouco foi analisado sobre o tema. Durante sua fala, Trump deixou bem claro que pretende retomar a dominância dos Estados Unidos no Espaço, e acrescentou “O espaço será importante monetária e militarmente. Nós não queremos que China, Rússia e outros países nos liderem. Nós sempre lideramos”. Esta percepção de ameaças vem do discurso de Putin, em março deste ano, quando o Presidente russo se vangloriou de seu Míssil hipersônico em desenvolvimento, que teria capacidade de não ser detectado pelos sistemas de defesa antimísseis norte-americanos, além da possibilidade de carregar uma ogiva nuclear (GENT, 2018) [2]. Assim como a China – a qual sempre enfatiza os objetivos pacíficos da exploração espacial – desenvolveu e testou armas antissatélites e antimísseis que segundo analistas norte-americanos poderiam desestabilizar e até mesmo destruir satélites dos Estados Unidos [3] [4]. 
Tendo em vista que a maioria dos think tanks de todo o mundo reconhecem que o espaço será o próximo campo de batalha e que os militares dos Estados Unidos dependem demasiadamente de operações espaciais, incluindo a vigilância, comunicações, comando e inteligência guiados por satélites, a defesa dos satélites é necessária e deve ser ampliada. No entanto, quaisquer tentativas de implantar sistemas armados no espaço serão repudiadas pela comunidade internacional e violará o tratado assinado em 1967 junto com a União Soviética e mais 100 países sobre os Princípios Reguladores das Atividades dos Estados na Exploração e Uso do Espaço Cósmico, inclusive a Lua e Demais Corpos Celestes. Espera-se que os Estados Unidos não desrespeite o Tratado e não desenvolvam mais armas para burla-lo de forma que o Espaço continue sendo utilizado para fins pacíficos e pesquisas científicas. 
Apesar do discurso de Trump afirmar que a Força Espacial e a Força Aérea serão braços das forças armadas “separados, mas iguais”, a Força Aérea alega que criar mais um ramo seria mais custoso do que manter o Comando dentro da Força Aérea e, como um serviço separado, criaria ainda mais competição por recursos de defesa. O Congresso está de acordo com a Força Aérea, e pretende assegurar que os EUA permaneçam dominantes no espaço próximo da Terra, garantindo que o Comando Espacial existente tenha os recursos de que precisa, em vez de criar desnecessariamente um novo serviço militar. 
Levando em conta a possibilidade de uma aprovação do Congresso e a criação de um sexto ramo do Departamento de Defesa, a Space Force ainda demorará provavelmente uma década para que consiga angariar fundos – entre infraestrutura, capacitação de pessoal especializado, projéteis, naves espaciais, veículos militares, e investimentos – suficientes para operar de forma plena, tendo em vista os cortes orçamentários empreendidos na administração Trump. Ainda não está disponível publicamente as devidas atribuições oficiais da Força Espacial, e espera-se que após a divulgação da Estratégia Nacional Espacial este ponto fique mais claro e que esteja de acordo com o uso do Espaço para fins pacíficos. 
Caroline Colbert é mestranda no Programa de Pós-Graduação em Economia Política Internacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro e Pesquisadora do Laboratório de Simulações e Cenários da Escola de Guerra Naval. 
Notas: 
[1] Discurso de Trump no dia 18 de junho de 2018. Trump announces new “Space Force” military branch. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=t-gwVFfTCnM>. 
[2] Este Míssil estará operacional até 2020 (GENT,2018). 
[3] Um relatório de 2015, encomendado pelo Departamento de Defesa dos EUA sugeriu que a China estava desenvolvendo sistemas antissatélites co-orbitais para atingir os recursos espaciais dos EUA (MCKIRDY,2018). 
[4] Até o fim de 2018 a China pretende enviar um par de missões conhecidas como Chang’e 4 com o objetivo de aterrissar do outro lado da lua – feito inédito na história da exploração lunar (CLARCK,2017). 
Referências: 
BERMAN, Russel. Does the U.S Military Need a Space Corps?. The Atlantic,2017. Disponível em: <https://www.theatlantic.com/politics/archive/2017/08/military-space corps/536124/>. Ultimo acesso em 23 de junho de 2018. 
CLARCK, Stuart. China’s moon mission to boldly go a step further. The Guardian, 2017. Disponível em: <https://www.theguardian.com/science/2017/dec/31/china-mission-to-far-side-of-the-moon-space-discovery>. Último acesso em: 23 de junho de 2018. 
GENT, Edd. Here’s What We Know About Russia’s Hypersonic Waverider Weapon. Live Science, 2018. Disponível em: <https://www.livescience.com/62653-russia-hypersonic-weapon.html>. Último acesso em: 23 de junho de 2018. 
HARISSON, Todd. Is Congress Creating a Military Space Corps?. Center for Strategic & International Studies,2017. Disponível em: <https://www.csis.org/analysis/congress-creating-military-space-corps>. Último acesso em 23 de junho de 2018. 
KLEIN, J. J. Space warfare: strategy, principles and policy. New York: Routledge Critical Security Studies, 2006. 
MCKIRDY, Euan. How does Trump’s Space Force compare to Russia and China’s space capabilities?. CNN, 2018. Disponível em: <https://edition.cnn.com/2018/06/19/politics/us-china-russia-space-force-intl/index.html>. Último acesso em: 23 de junho de 2018. 
WHITE HOUSE. President Donald J. Trump is Unveiling an America First National Space Strategy. 2018. Disponível em: <https://www.whitehouse.gov/briefings-statements/president-donald-j-trump-unveiling-america-first-national-space-strategy/>. Último acesso em 23 de junho de 2018.

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Divulgação científica de Relações Internacionais, Defesa e Economia Política Internacional ISSN 2596 2353