A morte de Fidel e o sempre tedioso lugar-comum

Por Glauber Cardoso Carvalho
Retrato de Fidel Castro, 1961 – Oswaldo Guayasamin
Fonte: Facebook.
O Blog Diálogos Internacionais, incumbido há dois anos de debater o cenário internacional, seus movimentos e contradições, não poderia deixar registrar, com esta pequena nota, a morte de Fidel Castro, líder cubano, revolucionário e uma das figuras que marcou e moldou o século XX.
Fidel faleceu no último dia 25 de novembro de 2016, em La Havana, Cuba, de onde não era mais presidente, já que passou o cargo para seu irmão Raúl Castro, em 2006. Era, contudo, respeitado e considerado, desde que tomou a ilha de Fulgêncio Batista, o eterno comandante supremo da nação.
Sua morte foi de causas naturais para um senhor de seus 90 anos, o qual a prisão, o combate e mais de 600 tentativas de assassinato não conseguiram derrubar. O fato em si foi um alívio para uns, um perda sem comparações para outros e teve a capacidade de dividir opiniões e famílias que nunca nem haviam tocado no assunto. Revelou, com isso, milhares de experts em política internacional e profundos conhecedores da economia e da sociedade cubana, seus problemas, defeitos, esperanças e demandas (#sqn). Isso, claro, nos referimos ao Brasil. E é por esse lado que vou falar brevemente, amparado nesses fatos, mais do que na figura polêmica e no último suspiro do homem.
Sua vida e sua história já foi passada a limpo por muitos estudos. O significado de seus atos foram, são e serão analisados em profundidade, por isso, será interessante, nestas linhas, discorrer um pouco sobre quatro contradições do discurso que surgiram nas redes sociais – que foram insuperáveis em um apanhado de lugares-comuns, mas que ao mesmo tempo também mostrou bastante comoção e real desconforto com o futuro da ilha e do mundo.
O primeiro lugar-comum é: “se eu não sou de esquerda, não posso falar bem, ou fazer uma análise que diga qualquer ponto positivo sobre o governo Cubano”. Isso aconteceu com diversas pessoas, dentre elas o nosso ex-talvez futuro-presidente, Fernando Henrique Cardoso. O post em sua página no face foi seguido de muitos comentários de seguidores que denunciavam que era ele um “comunista disfarçado”, que o admiravam até aquele momento, mas deixariam de segui-lo…
O segundo lugar-comum é: “ele foi um ditador, cruel, sanguinário, assassino…”… bom… quem viveu a repressão pesada poderia denunciar isso. Os que ficaram e estão lá com acesso à educação e saúde também poderiam dar seu depoimento. As dimensões são diferentes dependendo da luz e da visão. É claro que não se está fechando os olhos para prisões e mortes que ocorreram sem o que achamos ser o devido julgamento. A história é “julgada” por quem a escreve… confere, produção?
O terceiro lugar-comum é: “ele é milionário em um país pobre”… a Forbes não conseguiu comprovar, apesar do desafio que Fidel lançou. Ele se perguntava para que, aos 80, queria dinheiro. Que quem o difamava não havia entendido nada. Creio que ninguém teve acesso à realidade dessa informação, logo, seria minimamente equivocado falar isso. Além disso, ninguém cita o embargo dos Estados Unidos como um fato que manteve a ilha com uma economia precária nos últimos 50 anos.

O quarto lugar-comum é: “Você está se preocupando com Cuba, enquanto o Brasil vive problemas de corrupção”. Que vai na mesma linha de “a política externa petista financiou a ilha comunista.” Para esses dois, o melhor é não perder tempo explicando a dimensão das relações internacionais e a complexidade do processo decisório em política externa. Se houvesse diálogo até tudo bem, mas não há e não se move uma montanha de (pré)conceitos (ou conceitos formados) assim… talvez o profeta… vai saber.

Os lugares-comuns se avolumam (devo confessar, de forma muito particular, que essa pequena pesquisa em sites da extrema direita acaba fazendo mal… logo, é melhor parar).
Umas das observações finais é que seu velório foi assistido por milhares de pessoas. Isso pode significar alguma coisa. A outra é que estando já no poder, seu irmão manterá o controle da ilha até onde lhe for possível, e poderá, dentro das suas crenças mudar ou não a condução dos rumos de Cuba, como vem fazendo.
Com autorização do amigo, mestre em EPI e professor, Gregório Echeverría  cito seu post, que para mim foi lúcido e certeiro, invocando a necessária consulta às fontes (publicado em sua página pessoal em 27 de novembro):

“Cuba é um país com muitos problemas, muitos mesmo. O sistema cubano impõe restrições e limitações à população. Entretanto, em meio à uma profunda crise econômica, política, social, ética e moral que estamos vivendo no Brasil e no mundo, há alguns dados sobre Cuba que devemos ler com calma e fazer uma profunda reflexão sobre que futuro queremos para o Brasil e para o mundo. 

1) Cuba tem o segundo melhor IDH da América latina.
2) Cuba tem o melhor sistema educacional da América Latina.
3) Segundo OMS, o sistema de saúde cubano é um modelo mundial.
4) Segundo a ONU, Cuba é o 2ª país menos violento da América Latina, com 4,2 homicídios por 100 mil habitantes. Para efeito de comparação, esse índice chega a 25,2 por 100 mil habitantes no Brasil.
5) A taxa de alfabetização na ilha chega a 99,9%.
6) Cuba é o único país da América Latina com 0% de desnutrição infantil.
7) Possui o maior número de leitos por habitante (5,9 por 1000 habitantes) da América. O Brasil possui 2,4.
8) A melhor expectativa de vida da América Latina (79 anos).
9) A menor taxa de mortalidade infantil da América (5 para cada 1.000 nascimentos).O Brasil chega a ter 19 crianças mortas a cada 1.000 nascimentos.
10) A taxa mais alta de médicos por habitantes da América Latina, 1 para cada 160 habitantes. O Brasil 1 para cada 500 habitantes.
Fontes: Dados da ONU e do Banco Mundial.”


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Divulgação científica de Relações Internacionais, Defesa e Economia Política Internacional ISSN 2596 2353