Volume 1 | Número 5 | Out. 2014
Por Glauber Cardoso Carvalho e Larissa Rosevics
|
O poder do veto!
Ilustração: site 14º MiniOnu-PUC Minas |
Nesta semana, chegamos ao quinto (ufa!) e último post de análise da política externa dos Programas de Governos dos candidatos melhores colocados na campanha presidencial brasileira.
Alguns poucos artigos (além dos nossos) tentaram, igualmente, trazer à tona o tema que chegou a ser comentado em linhas gerais. Notamos, porém, que o tema política externa pouco reverberou nesta eleição.
De qualquer forma, cá estamos nós para verificar os últimos temas a serem explorados nesses posts: debate sobre multilateralismo e a governança global.
Multilateralismo e Governança Global
Nossa percepção é a de que as relações econômicas/comerciais de um país não estão desvinculadas das suas relações políticas no sistema internacional. Isso significa que a estratégia comercial proposta pelo presidenciáveis para o Brasil reflete a capacidade de projeção e de ação do país dentro desse sistema.
Ao se aproximar política e comercialmente dos países em desenvolvimento, o Governo do PT fortaleceu a posição crítica do Brasil sobre a necessidade de democratização das instituições internacionais como as Nações Unidas (e seu Conselho de Segurança), FMI, OMC e Banco Mundial. Dentre as conquistas alcançadas destacamos a escolha do diplomata brasileiro Roberto Carvalho de Azevêdo para a Secretaria Geral da OMC, eleito com o apoio dos países do Brics, das nações de língua portuguesa e de parceiros do Brasil na Ásia, África e América Latina.
Entende-se, assim, que dificilmente se descolam os temas nacionais e internacionais que são debatidos nos fóruns multilaterais, democracia, comércio, clima e etc. Todos devem fazer parte da agenda de Estado, mais do que de governo e exige, portanto, o constante fortalecimento do multilateralismo, independente de quem vença o pleito do próximo domingo, dia 5 de outubro (ou 26 de outubro) e assuma em 1º de janeiro de 2015.
Mudanças de rumos, desvios da rota, continuidades, quebra de paradigmas, rupturas ou fortalecimentos são motes de uma política internacional que, por não ser única e permitir que o jogador de turno dê novas cartas, carrega em si as agruras de nossa política partidária. Apesar disso, é constante e constatável o amadurecimento do Brasil em suas relações com outros povos e não parecem fecundas entre os candidatos propostas de profundas alterações.
Aécio Neves:
“Nas organizações internacionais, o Brasil deverá ampliar e dinamizar sua ação diplomática nos temas globais, como mudança de clima, sustentabilidade, energia, democracia, direitos humanos, comércio exterior, assim como novos temas, como terrorismo, guerra cibernética, controle da internet, e nas questões de paz e segurança, inclusive nas discussões sobre a ampliação do Conselho de Segurança.”
A proposta de Aécio é coerente com sua política comercial. O candidato do PSDB retoma a postura do partido durante os anos do governo FHC, ao priorizar temas internacionais colocados em pauta pelas grandes potências. Não há em sua agenda qualquer indício de confronto direto com os interesses dos Estados Unidos ou dos europeus. Assim, a questão do Conselho de Segurança, por exemplo, aparece como uma reivindicação de ampliação, e não de reformulação, como desejam os países em desenvolvimento.
Dilma Rousseff:
“Nossa presença no mundo será marcada pela defesa da democracia, pelo princípio de não-intervenção e respeito à soberania das nações, pela luta pela paz e pela solução negociada dos conflitos, pela defesa dos Direitos Humanos, pelo combate à pobreza e às desigualdades, pela preservação do meio-ambiente e pelo multilateralismo. Queremos construir igualmente mecanismos que protejam todas as formas de comunicação – a internet, em particular – assegurando a privacidade da cidadania, das empresas e dos Governos. A prioridade que conferimos a uma visão multilateral do mundo nos conduz e conduzirá a lutar pela reforma dos principais organismos internacionais, como a ONU, o Fundo Monetário Internacional, o Banco Mundial, entre outros, cuja governança hoje não reflete a atual correlação de forças global.”
A luta por uma ordem internacional mais democrática passa pela reforma dos principais organismos internacionais, conforme proposto pelo programa de Dilma Rousseff. A principal dificuldade com relação a isso é a sua efetividade, dadas as relações assimétricas de poder econômico e militar entre os Estados no sistema internacional. Ainda que os países em desenvolvimento tenham promovido coalisões e debates sobre o tema, pouco se avançou de fato nos últimos anos, principalmente a partir de 2008, com a crise econômica que se instaurou nos Estados Unidos e na Europa. Faltam propostas e ações concretas por parte do governo Dilma para que o projeto de uma ordem democrática seja possível no sistema internacional.
Marina Silva:
“Não se justifica a reticência em negociar novas frentes para o comércio de nossos bens e serviços. A valorização das tratativas na Organização Mundial do Comércio (OMC) é plenamente compatível com a negociação de acordos regionais e bilaterais.”
“É mais do que justo que o peso do voto do país nas deliberações do Fundo Monetário Internacional (FMI) seja elevado a um patamar que efetivamente corresponda à dimensão de nossa economia. Consideramos que também cabe insistir na reivindicação de que as chefias do FMI e do Banco Mundial deixem de ser monopólios de europeus e norte-americanos.”
“O pleito pela reforma na composição do Conselho de Segurança (CS) das Nações Unidas mantém sua atualidade, inclusive a fórmula de articulação conjunta (G-4) com outras potências regionais. Sem representatividade adequada, o CS não pode desincumbir-se com a eficácia desejável de suas elevadas atribuições nos campos da paz e da segurança”
O texto do Programa de Governo de Marina traz algumas reivindicações importantes, como “peso justo” nas deliberações do FMI e do Banco Mundial e reforma do Conselho de Segurança da ONU. Contudo, tais reivindicações esbarram em uma visão inocente de que tal pleito político está desvinculado dos debates comerciais que permeiam o sistema internacional.
A democratização das instituições do sistema internacional dificilmente será possível sem que seja acompanhada de ações internacionais de combate a pobreza e que promovam o desenvolvimento econômico e social de todas as nações. A liberalização de setores estratégicos, como as áreas de serviços e de compras governamentais, por exemplo, não parece ser o caminho mais adequado, o que torna o programa de governo de Marina inviável.