A Integração Educacional no Mercosul e a Unila

Por Larissa Rosevics


Em julho de 2017 o Brasil assumiu a Presidência Pro-Tempore do Setor Educacional do Mercosul (Mercosul Educacional), órgão responsável pela coordenação das políticas educacionais entre os países membros do bloco. Na 50ª Reunião de Ministros da Educação do Mercosul, que aconteceu em Buenos Aires no dia 16 de junho de 2017, o Ministro da Educação brasileiro, Mendonça Filho exaltou a reunião e destacou ações do governo brasileiro com objetivo de facilitar a mobilidade entre universitários dos países membros do Mercosul (Portal do MEC, 2017).
A Reunião de Ministros da Educação do Mercosul (RME), criada em 1991, foi a segunda instância desse tipo no bloco e, desde então, mantém regularmente suas reuniões e atividades (ROSEVICS, 2015). Diferente da integração econômica, em que nem todos os países membros e associados do Mercosul podem participar plenamente, por questões comerciais, o nível de engajamento é alto quanto se trata da integração educacional. Nos seus 26 anos de existência, o Setor Educacional do Mercosul obteve avanços significativos em diferentes áreas. Hoje qualquer estudante que tenha realizado seus estudos primário, médio (Decisão 04/1994) ou médio técnico (Decisão07/1995) em um dos países do bloco tem seus diplomas reconhecidos em todos os demais países. Os alunos de ensino superior tem assegurado o direito de prosseguirem seus estudos de pós-graduação em qualquer país do Mercosul (Decisão 04/1996) e aos professores é assegurado o reconhecimento de seus títulos e graus universitários para exercício de atividades acadêmicas (Decisão 04/1999).
A Presidência Pro-Tempore do Brasil no Mercosul Educacional não poderia acontecer em momento mais oportuno, em que o projeto mais ousado e complexo apresentado pelo Brasil ao Setor, qual seja, a Universidade Federal da Integração Latino Americana (Unila), está ameaçada.
Em 2006, durante encontro para a assinatura do “Protocolo para Criação de Mecanismo Permanente Conjunto em Temas Educacionais”, os então Ministros da Educação do Brasil Fernando Haddad e o Ministro argentino Daniel Filmus discutiram a proposta para a criação de uma “Universidade do Mercosul” (ALMEIDA, 2015). A ideia inicial era criar uma instituição de ensino superior multinacional, em que estudantes e professores de todos os países membros do Mercosul pudessem participar desenvolvendo atividades de pesquisa, ensino e extensão voltadas para a integração regional do Mercosul. A Itaipu Binacional, localizada em Foz do Iguaçu, interessada no projeto, comprometeu-se em fornecer auxilio técnico e logístico para a instituição. Porém, a implantação da “Universidade do Mercosul” necessitava de uma integração educacional de nível superior muito mais profunda do que o existente e orçamento maior do que o previsto para o Fundo de Financiamento do Setor Educacional do Mercosul (FEM).
Ciente da importância da educação para a integração sul-americana, integração essa tem papel fundamental na política externa brasileira (AMORIN, 2009), o Governo de Lula da Silva transformou a ideia da “Universidade do Mercosul” na Unila, uma instituição pública de ensino superior brasileira que surge internacionalizada, com metade das suas vagas destinadas a alunos dos demais países latino-americanos, com professores de diferentes nacionalidades, em uma cidade que faz fronteira com dois outros países e que busca promover a construção de conhecimento voltado as necessidades objetivas dos povos da América Latina. A Unila, assim como a Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab) são instituições únicas em seus objetivos e suas potencialidades para a política externa brasileira (CARVALHO; ROSEVICS, 2013).
O Deputado Sérgio Souza (PMDB/PR), propôs na emenda aditiva à Medida Provisória nº 785/2017 (que trata sobre financiamento estudantil), que Universidade Federal da Integração Latino-Americana (Unila) seja convertida em Universidade Federal do Oeste do Paraná (UFOPR). Desta forma, a universidade perderia sua identidade voltada para a integração latino americana.
O referido projeto, verdadeiro cavalo de Troia, ignora por completo o valor estratégico da instituição bem como da Integração Regional para o Brasil. A Unila representa a busca do país em concretizar o principio constitucional de “[…] integração econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações”, conforme parágrafo único do artigo 4º da Constituição de 1988.
Assim como qualquer outra instituição de ensino superior no mundo, a Unila tem suas disputas intelectuais, suas disputas de poder, bem como suas limitações físicas, financeiras e acadêmicas. Alguns desses problemas inclusive são mais complexos que o normal devido a sua natureza multinacional, multiétnica e multilinguística. Contudo, nenhuma desses problemas inviabilizou sua criação, nem a sua existência. Acusá-la de ser “reduto chavista”, de ser um “elefante branco”, e de fazer “doutrinação ideológica” é ignorar o papel estratégico exercido pela instituição e pela educação para a Integração Regional, que enquanto vigorar a Constituição de 1988, continuará sendo parte do interesse nacional brasileiro.
Referências:

ALMEIDA, Larissa Rosevics de. O Mercosul Educacional e a criação da Unila no início do século XXI: por uma integração regional via educação. Tese (Doutorado em Economia Política Internacional). Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: UFRJ, 2015.
ÁMBITO. Bullrich encabezó la reunión de ministros de Educación del Mercosur. 16 jun.2017. Disponível em: http://www.ambito.com/886797-bullrich-encabezo-la-reunion-de-ministros-de-educacion-del-mercosur 
AMORIM, Celso. A integração sul-americana. Diplomacia, Estratégia & Política, Brasília, n.10, p.5-26, out/dez 2009.
CARVALHO, Glauber C., ROSEVICS, Larissa. A política externa do governo Lula para a América do Sul: Unasul e Unila In: SARTI, Ingrid; et all. Por uma integração ampliada da América do Sul no século XXI.1 ed. Rio de Janeiro : Perse, 2013, v.1, p. 225-240.
GONÇALVES, William. Panorama da política externa brasileira no Governo Lula da Silva In: FREIXO, Adriano; PEDONE, Luiz; RODRIGUES, Thiago Moreira; ALVES, Vágner Camilo (orgs.). Política Externa Brasileira na era Lula: um balanço. Rio de Janeiro: Apicuri, 2011. p.11-31.
H2FOZ. Comunidade está mobilizada para defender a UNILA. 17 jul.2017. Disponível em: http://h2foz.com.br/pt/noticias/recursos-naturais-e-residuos/comunidade-esta-mobilizada-para-defender-a-unila
PORTAL MEC. Brasil assume presidência pro tempore do setor educacional e propõe sistema de avaliação. 16 de jun.2017. Disponível em http://portal.mec.gov.br/component/content/article?id=50281
REPÚBLICA Federativa do BRASIL. Ministério da Educação; REPÚBLICA da Argentina. Ministério da Educação, Ciência e Tecnologia. Protocolo entre o Ministério da Educação da República Federativa do Brasil e o Ministério da Educação, Ciência e Tecnologia da República Argentina para a criação do Mecanismo Permanente Conjunto em Temas Educacionais. Buenos Aires, 19 jul. 2009. Disponível em: http://dai-mre.serpro.gov.br/atos-internacionais/bilaterais/2006/b_118/ 
ROSEVICS, Larissa. Por uma integração via educação: o novo marco do Mercosul Educacional no século XXI. Mural Internacional: Revista NEIBA Argentina-Brasil, v.4, n.1, p.116-128, 2015.

Diálogos Internacionais

Divulgação científica de Relações Internacionais, Defesa e Economia Política Internacional ISSN 2596 2353