O CRESCIMENTO ECONÔMICO INDIANO PÓS-INDEPENDÊNCIA
Edição Especial: Ásia
Volume 11 | Número 113 | Nov. 2024
Por Lucas Feitosa Vidal
INTRODUÇÃO
A trajetória econômica da Índia no último século é, sem dúvidas, uma das mais impressionantes da história contemporânea. Após conquistar sua independência em 1947, o país se via em uma situação extremamente precária, com por volta de 80% da população vivendo abaixo da linha de pobreza de 2.200 calorias diárias. Em apenas meio século, contudo, a Índia conseguiu transformar radicalmente esse cenário, e, em 2022, esse número já havia caído para 9%[1].
Este artigo tem como objetivo explicar esse crescimento tão expressivo e apontar os fatores que contribuíram para a transformação econômica da Índia. Para isso, serão estudados, por meio de revisão da literatura econômica existente, os diferentes períodos da economia indiana, buscando entender os impactos de suas políticas nos curto e longo prazos, e como elas ajudaram a moldar o atual crescimento econômico do país.
1 A ERA NEHRU
Nos anos após sua independência, a Índia ainda era uma nação jovem, que buscava se afirmar e estabelecer sua autonomia. Esse desejo guiou fortemente o governo de Jawaharlal Nehru, primeiro-ministro indiano de 1947 até 1964, cuja visão de um país independente e socialmente justo viria a moldar a economia indiana pelas três décadas seguintes. Influenciado por ideais socialistas e pelo modelo soviético, a política de Nehru era baseada em desenvolvimento impulsionado pelo Estado, e focada em indústrias de base e no controle estatal sobre a economia. Por mais que essas medidas tenham ajudado a estruturar a indústria indiana e a desvencilhar o país da estagnação característica do período colonial, elas acabaram contribuindo para a chamada Taxa de Crescimento Hindu (“Hindu Rate of Growth”), um período de 1950 a 1980 marcado por crescimento econômico baixo quando comparado ao de outros países em desenvolvimento – por volta de 3,5% ao ano (VIRMANI, 2004).
A política de Nehru era inteiramente baseada no planejamento econômico centralizado por meio de Planos Quinquenais, formulados, por sua vez, pela Comissão de Planejamento. O Segundo Plano Quinquenal (1956-1961) priorizou investimentos na indústria de base, com o objetivo de criar uma base industrial robusta que gerasse efeitos multiplicadores, difundindo benefícios por diversos setores da economia, conforme previsto pelo Modelo Mahalanobis[2], que exerceu forte influência sobre a política de Nehru. No entanto, esse modelo orientado pela oferta ignorou a demanda imediata por trabalho, em uma sociedade agrária e rica em mão de obra. O investimento em indústria de base foi intensivo em capital e, portanto, limitado em termos de criação de empregos, deixando uma grande parcela da força de trabalho, especialmente nas áreas rurais, sem poder participar ou se beneficiar do crescimento industrial (BALAKRISHNAN, 2007).
Reforçando ainda mais o papel do Estado na industrialização, Nehru atribuiu às empresas públicas o papel de liderança em setores centrais como aço e energia, de forma que o estado pudesse controlar os principais recursos e determinar as prioridades nacionais. Esse domínio foi executado em conjunto à estratégia de Industrialização por Substituição de Importações (ISI), que visava proteger as indústrias domésticas da concorrência estrangeira por meio de altas tarifas, cotas e políticas comerciais restritivas. Contudo, essa estratégia isolou as empresas domésticas de pressões competitivas, levando a ineficiências e à ausência de grandes incentivos para melhorias na produtividade. Assim, as empresas públicas e as indústrias protegidas frequentemente possuíam baixa produtividade e inovação, limitando sua capacidade de atender à crescente demanda doméstica (WILLIAMSON e ZAGHA, 2002; TOPALOVA, 2010).
Além disso, o rígido ambiente regulatório do período agravava ainda mais esses desafios. Para coordenar o crescimento industrial, o governo estabeleceu um complexo sistema de licenças e controles conhecido como “License Raj”. Essa burocracia exigia que as empresas obtivessem a aprovação do governo para quase todas as suas operações, desde o estabelecimento de novas empresas até a importação de bens de capital e a expansão de suas atividades(WILLIAMSON e ZAGHA, 2002). Como consequência, havia barreiras administrativas significativas ao empreendedorismo, que desencorajavam a participação no setor privado e a expansão de empresas (KOTWAL et al., 2011), assim como também facilitavam a corrupção (MUKHERJI, 2013). Isto limitou o crescimento do setor privado, restringindo seu potencial para gerar empregos e diversificar a economia (WILLIAMSON e ZAGHA, 2002).
A agricultura, que empregava a enorme maioria da população, ocupou uma posição secundária na estratégia econômica de Nehru. Embora o governo tenha realizado alguns investimentos no setor, a agricultura foi ofuscada pela indústria de base nos planos nacionais (BALAKRISHNAN, 2007). Esse investimento limitado resultou em baixa produtividade agrícola, o que restringiu tanto a renda rural quanto o crescimento da demanda. O lento avanço da agricultura prejudicou o desenvolvimento econômico mais amplo, pois deixou as famílias rurais com poder de compra restrito e manteve grande parte da população em atividades de baixa produtividade. Essa estagnação na renda rural limitou a demanda por bens industriais e atrasou a transição para setores mais produtivos, como manufatura e serviços – essenciais para um crescimento sustentável e para a geração de empregos a longo prazo (DAS et al., 2021; BALAKRISHNAN, 2007).
Houve diversos avanços na economia indiana durante o governo Nehru. Notavelmente, o país conseguiu se desvencilhar das políticas coloniais exploradoras e iniciar o processo de superação da estagnação econômica desseperíodo. Criou-se uma base industrial, que ajudou a reduzir a dependência nacional de importações em setores estratégicos, e a criação de um setor público forte permitiu o desenvolvimento de uma infraestrutura de serviços como energia e transportes, que seria crucial para o crescimento futuro. Essa abordagem trouxe uma transformação econômica gradual e resgatou a economia indiana da escassez estrutural e baixa produtividade do período colonial, tornando o país mais autônomo e menos vulnerável ao longo das décadas seguintes (BALAKRISHNAN, 2007).
No entanto, a estratégia de Nehru acabou criando também grandes problemas estruturais que limitaram o potencial econômico da Índia por muitos anos. A forte ênfase nas indústrias de base, em conjunto com políticas restritivas ao empreendedorismo, contribuiu para um sistema com alta ineficiência, baixa produtividade e criação insuficiente de empregos. O foco do setor público nos investimentos intensivos em capital, também, não acomodou a abundância de mão de obra da Índia, e o escanteamento da agricultura restringiu o crescimento em um setor crítico para o desenvolvimento econômico do país. A mistura desses fatores criou um ambiente onde o crescimento econômico era naturalmente restrito, e veio a se configurar como a Taxa de Crescimento Hindu (DAS et al., 2021).
2 O PRIMEIRO GOVERNO DE INDIRA GANDHI
A economia indiana sob Indira Gandhi, primeira-ministra de 1966 a 1977, manteve elementos centrais das políticas de Nehru, introduzindo, no entanto, mudanças notáveis. A ênfase de Nehru no desenvolvimento orientado pelo Estado e nas indústrias de base continuou, mas, sob Indira Gandhi, houve um aumento do controle e da intervenção estatais, ampliando as nacionalizações, incluindo bancos e setores estratégicos, além de implementar controles de importação mais rígidos e aumentar os requisitos de licenciamento industrial (NAYAR, 2006).
Essas políticas visavam promover autossuficiência e desenvolvimento igualitário, mas acabaram sufocando o investimento privado e a concorrência. Além disso, a abordagem de Indira Gandhi priorizava cada vez mais a consolidação política, usando medidas econômicas para garantir a base de poder do partido, o que muitas vezes comprometia a eficiência econômica do país. Nehru, em contraste, buscou um equilíbrio entre o papel do Estado e a iniciativa privada (HANKLA, 2006).
Uma das principais iniciativas econômicas de Indira Gandhi foi a nacionalização dos bancos em 1969, queenvolveu a transferência de 14 grandes bancos privados para o controle estatal. A medida visava promover uma expansão mais inclusiva dos serviços financeiros, facilitando o crédito rural e direcionando recursos para setores prioritários, como agricultura e pequenas indústrias, negligenciados pelo sistema bancário privado. Essa medida impulsionou a rede bancária, especialmente em zonas rurais, levando a um aumento das taxas de poupança doméstica e melhorando o acesso ao crédito. No entanto, a nacionalização também gerou problemas econômicos, como o surgimento de ineficiênciasfinanceiras, a politização das decisões de crédito e um aumento na quantidade de ativos não produtivos (NAYAR, 2006).
O impacto econômico dessas políticas foi significativo. O crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) caiu para 2,9% ao ano, uma redução considerável em relação aos 4,1% do período de Nehru. O crescimento agrícola, também, caiu para 1,4% ao ano, metade da taxa anterior. O aumento dos Índices de Produção de Capital Incremental (ICORs) – investimento divido pelo crescimento econômico – em diversos setores também apontava para um aumento das ineficiências e a má alocação de recursos – na agricultura, por exemplo, o ICOR triplicou (VIRMANI, 2004).
Além disso, crises externas agravaram esses desafios. A guerra de 1965 com o Paquistão, secas severas e os choques globais do petróleo em 1973 e 1979 pressionaram ainda mais a economia indiana, que dependia do petróleo importado, criando problemas no balanço de pagamentos (NAYAR, 2006; MUKHERJI, 2013).
Assim, no final da década de 1970, surgiu um reconhecimento gradual de que o modelo vigente tinha limitações, levando a alguns passos iniciais em direção à desregulamentação em áreas como licenciamento e controles de importação(NAYAR, 2006). Esses movimentos modestos lançaram as bases para as reformas mais significativas que moldariam a economia da Índia nas décadas de 1980 e 1990.
3 O INÍCIO DA LIBERALIZAÇÃO NA DÉCADA DE 1980
No início da década de 1970, a economia indiana enfrentava estagnação, alta inflação e agitação social, o que levou a uma reavaliação crítica das políticas socialistas do país. Após o primeiro choque do petróleo, em 1973, o governo começou a implementar, por volta de 1974-75, as primeiras medidas de liberalização econômica. Essas mudanças, ainda limitadas, incluíam relaxamento de certos controles estatais, incentivos às exportações e medidas trabalhistas para conter a inflação (NAYAR, 2006).
Já na década de 1980, a política econômica evoluiu de forma mais gradual, indo em direção a um ambiente mais favorável aos negócios. Sob a liderança de Indira Gandhi e depois de Rajiv Gandhi, o foco mudou de redistribuição e desenvolvimento estatal para políticas que incentivassem o investimento privado e apoiassem grandes empresas.
A liberalização dos anos 1980 visava aumentar a lucratividade das empresas existentes, sem necessariamente promover um mercado mais competitivo. As medidas adotas incluíram, por exemplo, concessões fiscais, diminuição de certas exigências burocráticas, incentivos ao investimento privado em setores públicos, facilitação de licenciamento de importação, diluição da política de controles de preços etc. De forma geral, reduziu-se a intervenção do governo nesse período, ajustando gradualmente a economia a menor controle estatal, sem, entretando, adotar uma postura completamente pró-mercado (KOHLI, 2006a).
O governo continuou, nesse período, a investir fortemente em infraestrutura, considerada essencial para apoiar o setor privado. Setores como carvão, energia e ferrovias receberam investimentos para resolver problemas de infraestrutura escassa e para estimular o crescimento econômico. Embora essas políticas tenham impulsionado o PIB e o setor privado, o foco em apoiar grandes empresas ao invés de promover concorrência total indicava uma abordagem cautelosa à liberalização (KOHLI, 2006a).
Apesar do aumento no crescimento econômico nacional, essa abordagem também trouxe consequências macroeconômicas negativas, notavelmente o crescente déficit fiscal. As políticas de incentivo ao setor privado e o aumento dos gastos públicos elevaram o déficit de 5,4% do PIB no final dos anos 1970 para quase 10% no final dos anos 1980 (MUKHERJI, 2013). Esse déficit foi impulsionado por uma combinação de aumento de gastos e redução de receitas tributárias, criando pressões fiscais insustentáveis que contribuíram para a instabilidade econômica do país(PANAGARIYA, 2004; MUKHERJI, 2013; KOHLI, 2006a).
Em resumo, as políticas econômicas do final dos anos 1970 e 1980 estimularam o crescimento, mas também abriram caminho para instabilidade no início da década de 1990. A postura pró-negócios e o aumento de gastos públicos incentivaram o investimento privado e o desenvolvimento de infraestrutura, mas resultaram em déficits fiscais e correntes elevados, além de uma crescente dependência de empréstimos externos (KOHLI, 2006a). No final dos anos 1980, a Índia enfrentava grandes problemas econômicos que culminariam na crise de 1991, tornando clara a necessidade de uma reforma econômica mais abrangente, que o país viria a adotar na década seguinte.
4 TRANSFORMAÇÃO ECONÔMICA EM 1991
As reformas dos anos 1980, embora tenham gerado crescimento, também levaram a déficits fiscais e correntes elevados, uma maior dependência de dívida externa e vulnerabilidade a choques externos. No início da década de 1990, esses desequilíbrios chegaram ao limite, resultando na crise econômica de 1991.
A crise de 1991 foi uma crise de balanço de pagamentos, caracterizada por uma queda tão grave nas reservas de câmbio que o país estava à beira da inadimplência pela primeira vez em sua história. Fatores como a Guerra do Golfo, o colapso do bloco soviético e o aumento das taxas de juros globais agravaram a já complicada situação fiscal. A instabilidade política, com sucessivas trocas de governo e o assassinato de Rajiv Gandhi[3], prejudicou ainda mais a confiança dos investidores e credores (CERRA e SAXENA, 2002). Diante da iminente inadimplência, o governo lançou um programa abrangente de reformas sob a liderança do primeiro-ministro P.V. Narasimha Rao e do Ministro das Finanças Manmohan Singh.
Essas reformas marcaram uma mudança significativa, afastando-se ainda mais do modelo estatal em direção a uma economia de mercado. O desmantelamento do License Raj, primeiramente, foi central, pois removeu exigências de licenciamento para a maioria das indústrias e aliviou a regulação sobre grandes empresas, aumentando a competitividade e abertura ao empreendedorismo, permitindo um ambiente econômico mais dinâmico e eficiente (KOTWAL et al., 2011; WILLIAMSON e ZAGHA, 2002)
Outro pilar das reformas foi a liberalização do comércio, com a redução de tarifas de importação, a eliminação de restrições e a desvalorização da rupia para impulsionar as exportações. A Índia também abriu o setor de investimento estrangeiro, permitindo até 51% de participação em setores prioritários e acesso ao mercado de ações indiano para investidores institucionais estrangeiros (KOTWAL et al., 2011). Essas mudanças foram projetadas para atrair capital, tecnologia e experiência estrangeiros, modernizando a indústria indiana.
No setor financeiro, o governo adotou medidas para fortalecer os bancos e o mercado de capitais, como a liberalização das taxas de juros, a entrada de bancos privados e estrangeiros, e o desinvestimento seletivo em empresas estatais (MUKHERJI, 2013). Embora limitada, essa privatização parcial marcou uma transição para uma economia mista, com um papel mais relevante para o setor privado. O Fundo Monetário Internacional (FMI) desempenhou um papel crucial nessa transição, oferecendo um empréstimo com condições, como a consolidação fiscal, ajustes cambiais e, de fato, a liberalização comercial (MUKHERJI, 2013; KOHLI, 2006b).
As reformas estabilizaram a economia a curto prazo, melhorando as reservas de câmbio e atraindo capital. O crescimento do PIB se recuperou, e em 1992-93, a situação cambial estava estabilizada (VIRMANI, 2001). No entanto, a abertura econômica também trouxe desafios, expondo indústrias de pequena escala à concorrência internacional e gerando pressões internas (KOHLI, 2006b).
A longo prazo, essas reformas remodelaram a economia indiana, promovendo um modelo orientado para o mercado e impulsionando o setor privado. O setor de serviços se destacou como uma força motriz para o crescimento, e a Índia se integrou à economia global, expandindo suas exportações e atraindo mais capital estrangeiro. No entanto, críticos apontam que as reformas beneficiaram mais as grandes empresas, enquanto pequenas e médias empresas enfrentaram dificuldades (KOTWAL et al., 2011; KOHLI, 2006b).
As reformas também impactaram a agricultura e a desigualdade de renda. A liberalização financeira reduziu o crédito para a agricultura e o crescimento agrícola desacelerou, contribuindo para uma crise rural. Principalmente, a desigualdade de renda aumentou, à medida que as grandes empresas em áreas urbanas se beneficiaram mais das reformas do que as populações rurais (KOTWAL et al., 2011; KOHLI, 2006b).
5 PÓS-1991
No final da década de 1990, após as reformas de 1991, a economia da Índia havia feito a transição para um modelo mais liberalizado e globalmente integrado. O crescimento econômico teve uma média de cerca de 6% no final da década, posicionando a Índia entre as nações em desenvolvimento que mais cresciam na época (KOTWAL et al., 2011). Este período viu o aumento da estabilidade, a redução da pobreza e um aumento significativo do setor de serviços. Muitos dos desafios persistiram ainda, particularmente com o déficit fiscal e as finanças públicas como um todo (KOHLI, 2006b), mas as bases estabelecidas na década de 1980 e solidificadas pelas reformas de 1991 haviam colocado a Índia agora em uma nova trajetória de crescimento.
Entrando na década de 2000, o crescimento econômico da Índia acelerou ainda mais, atingindo uma média de 8% no período de 2002 a 2007, impulsionado pelo crescente setor de serviços, que incluía finanças, telecomunicações e TI(DAS et al., 2021). Esta década foi marcada por mais liberalização (NAGARAJ, 2000), particularmente no que diz respeito ao aumento do investimento estrangeiro direto (KOTWAL et al., 2011).
CONCLUSÃO
Acadêmicos propõem várias teorias para explicar o alto crescimento econômico da Índia no século atual, atribuindo-o, normalmente, à crescente postura pró-negócios do governo (RODRIK e SUBRAMANIAN, 2004; NAYAR, 2006) ou às melhorias na produtividade, especialmente no setor de serviços (ROBERTSON, 2012; BALAKRISHNAN ePARAMESWARAN, 2007; KOTWAL et al., 2011; DAS et al., 2021). Há divergências sobre o ponto de virada exato da trajetória de crescimento (BOSWORTH et al., 2007): enquanto alguns apontam para 1980, com a mudança de atitude do governo em relação ao setor privado e políticas mais favoráveis aos negócios – o que teria aumentado a confiança dos investidores e promovido uma atividade empreendedora maior e mais livre, que lançou as bases para as liberalizações seguintes (RODRIK e SUBRAMANIAN, 2004; NAYAR, 2006; BOSWORTH et al., 2007) – outros creditam as reformas de 1991, que trouxeram liberalização substancial e abriram a economia indiana para o mercado global (MUKHERJI, 2013; KOHLI, 2006b).
Outro fator importante foi a base de manufatura criada durante a era da substituição de importações, que, apesar de custosa no curto-prazo, preparou o terreno para o crescimento industrial (RODRIK e SUBRAMANIAN, 2004). A nacionalização bancária de 1969 também desempenhou papel crucial, expandindo o acesso ao crédito para áreas rurais e pequenas empresas, e impulsionando a atividade econômica em diversos setores (KOTWAL et al., 2011). Ainda que o investimento público em infraestrutura tenha diminuído na década de 1990, ele continuou sendo um apoio essencial ao crescimento, especialmente para o crescente setor privado (KOHLI, 2006b).
Notavelmente, a rápida expansão do setor de serviços após as reformas de 1991 foi essencial para o crescimento econômico dos anos seguintes, tornando-se rapidamente um dos setores mais dinâmicos da economia indiana. Ao contrário dos períodos anteriores, quando o setor era dominado por funções governamentais, o pós-reforma viu o fortalecimento de áreas como tecnologia e informação (TI), telecomunicações e finanças, impulsionado pela liberalização e pelos avanços tecnológicos. Essa transformação foi facilitada pela força de trabalho qualificada da Índia, consequência de investimentos no ensino superior, e permitiu que o país se tornasse um líder global em alguns desses setores (RODRIK e SUBRAMANIAN, 2004; DAS et al., 2021; KOTWAL et al., 2011).
Portanto, apesar da ausência de consenso sobre as origens históricas do crescimento econômico indiano contemporâneo, pode-se afirmar que a economia indiana atual é, sem dúvida, moldada por – e deve em grande parte seu sucesso a – uma combinação das reformas estruturais, mudanças filosóficas e crescente abertura ao mercado global que ocorreram ao longo das últimas décadas.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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WILLIAMSON, John; ZAGHA, Roberto. From the Hindu Rate of Growth to the Hindu Rate of Reform. Stanford University, 2002.
[1] Dado extraído de www.deccanchronicle.com/opinion/columnists/180822/how-did-we-do-in-75-years-clearly-better-than-most.html#. Acesso em 8/11/2024
[2] Modelo econômico desenvolvido pelo estatístico indiano P.C. Mahalanobis, que fornecia uma base teórica para aumentar a renda nacional por meio da industrialização. Consiste em um modelo de economia fechada com dois setores (bens de capital e bens de consumo) em que o capital não sofre retornos decrescentes, de forma que um maior investimento inicial no setor de bens de capital aumenta o estoque futuro de capital, gerando maior investimento e produção (Balakrishnan, 2007).
[3] Gandhi foi assassinado em 1991 por um membro do grupo militante sri-lanquês Tigres de Liberação do Tamil Eelam, devido ao envolvimento indiano na guerra civil do Sri Lanka, para a qual Gandhi havia enviado forças de peacekeeping para mediar entre o governo e os separatistas tâmeis.
Lucas Feitosa Vidal é graduando em Relações Internacionais no Instituto de Relações Internacionais e Defesa da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IRID-UFRJ) e pesquisador do Laboratório de Estudos Asiáticos (LEA-IRID).