Diferentes perspectivas sobre Imperialismo acerca da Guerra da Ucrânia

Volume 12 | Número 115 | Fev. 2025

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Por Gabriel Claudemiro Farias de Souza e

Luiz Felipe Brandão Osório

INTRODUÇÃO

Atualmente, muito se percebe, tanto nos monopólios de impressa, como nos meios intelectuais, apesar das divergências com relação à visão de mundo, a tendência às análises sobre o internacional de apresentar elevado grau de crise ou constante conflito no campo das Relações Internacionais. No fundamental, estas análises comumente apresentam um pessimismo quanto a melhoria da economia mundial, como também com relação ao fim das guerras entre as nações.

Sabendo-se que cada tipo de organização defende um propósito político específico, representantes que são de determinadas classes e suas frações políticas, a seu modo, estas visões de mundo apresentam de fato um período histórico de regressão econômica e política, ao se comparar com o que já apresentou o sistema internacional, em sua forma.

Apesar disso, determinadas análises na maioria dos casos se limitam a florear as Organizações Internacionais e seu papel de suposta neutralidade frente a crise econômica e os cataclismos políticos e sociais que estouram em todo canto do globo, mascarando que, tanto o sistema internacional e as organizações são fruto do desenvolvimento do capitalismo e seu estágio imperialista (OSÓRIO, 2019).

Dado o cenário de profundo caos no sistema financeiro, o qual a taxa de lucro advindo dos monopólios tende a decrescer drasticamente; em período onde as crises econômicas e políticas mais agudas e com menor espaçamento histórico se tornam a regra; em que há tendência de aguçamento das guerras pela partilha do mundo e a disputa pelo lucro máximo, o aprofundamento das lutas dos povos do mundo, e o descrédito da ordem de democracia liberal, não à toa a perceptível volta da extrema direita no sistema internacional; percebe-se a violência política mais aberta que toma novamente as rédeas da seara internacional, e a guerra na Ucrânia funciona como um acelerador da crise intestina ao sistema imperialista. (KONICZ, 2022).

No assunto a ser exposto, as diferentes visões de mundo se materializam em três polos, com relação à guerra que toma palco na Ucrânia, e que carregam propósitos políticos diferentes. O objetivo do artigo é o de ampliar o debate sobre o caráter da guerra na região, bem como apresentar assertivas sobre o imperialismo nos dias atuais.

Diferentemente do convencional, a proposta é fornecer visão contrária ao discurso hegemônico sobre a guerra, seja sobre suas limitações à análise comportamental dos atores envolvidos, ou a moralização do conflito. Para tanto, o artigo vai se valer de uma técnica de pesquisa explanatória que apresenta aspectos qualitativos a partir de revisão bibliográfica sobre o tema.

Com base nisso, o texto se estrutura em três capítulos: o primeiro, sobre o contexto histórico da guerra; o segundo, sobre o panorama teórico nas Relações Internacionais; e o terceiro, análise concreta sobre a guerra. Em suma, considera-se que esse conflito se torna um divisor de águas no cenário internacional não apenas do ponto de vista da política internacional, mas também impactando teoricamente os debates sobre imperialismo atualmente.

HISTÓRICO DE GUERRA

A começar pelos antecedentes, a Guerra na Ucrânia tem como pano de fundo as disputas, pós-guerra fria, entre dois blocos distintos: o da Rússia e o dos Estados Unidos, principalmente. Após a Guerra Fria, as tensões entre os dois países não arrefecem, mas sim, tomam uma outra forma.

A OTAN, criada com o objetivo de frente militar e ideológica contra a “ameaça do bloco soviético” torna-se um aparelho robusto, resultado da hegemonia dos Estados Unidos e sua disputa por mercado e pela expansão do dólar pelo globo (CAMPOS, 2023).

Militarmente, considerando que os países-chave da União Europeia se mantiveram neutralizados, a Rússia chega ao começo do século XXI como a única potência capaz de fazer frente ao poderio bélico dos Estados Unidos.

Dessa forma, durante os anos, a principal aproximação dos Estados Unidos para com a Rússia foi pela via militar, diretamente ou por meio das ameaças, não somente pela disputa de áreas de influência para onde fosse possível o fluxo do dólar, como também para minar o poderio da outra superpotência, limitada ao arsenal atômico.

Disputas como na Crimeia; também historicamente na Ucrânia, se fizeram presentes, pelas pressões diplomáticas e militares que a OTAN confere à Rússia, com objetivo tanto de dominar os países que antes orbitavam na esfera de influência da ex-União Soviética, como também minar o poderio militar russo, fazendo avançar defesas sofisticadas contra o arsenal militar da Rússia, como as defesas anti-míssil.

Recentemente na história, o conflito atual tem muita influência da intensificação da disputa entre as duas potências pela Ucrânia: num cenário em que as massas da Ucrânia vão às ruas por motivos os mais diversos, mas tendo como pano de fundo insatisfações com medidas tomadas por governo pró-Rússia, de um lado os Estados Unidos e a OTAN usam do cenário para investir em milícias de extrema-direita anti-Rússia para disputar a direção da insatisfação popular e fazer pressão para que os protestos se tornassem a favor da adesão da Ucrânia à OTAN; de outro, a Rússia, e a defesa a regiões da Ucrânia onde havia influência de grupos pró-Rússia, fazendo frente às pressões da OTAN e disputando a influência da região.

A linha central do conflito que conduziu ao atual embate geopolítico é a possível expansão da OTAN para o leste no espaço pós-soviético. A Ucrânia é o objetivo geopolítico. Desde o golpe de 2014 apoiado pelo Ocidente, quando o então governo pró-russo de Yanukovych foi derrubado pelas forças nacionalistas, Kiev tenta ingressar na OTAN e na UE, apesar da guerra civil, dos conflitos congelados e das questões territoriais não resolvidas, para tornar irreversível a integração do país pós-soviético ao Ocidente (KONICZ, 2022).

Período conhecido como o Euromaidan, representa já naquela época, profunda crise do sistema imperialista como um todo, tendo como marco a consolidação do retorno da extrema-direita na cena política internacional, e na Ucrânia isso se dá pelo financiamento da Otan à milícias neonazistas para desestabilizar o protesto popular, e ser a força de pressão à adesão do país ao bastão de mando da OTAN.

Como resultado, o bastão de mando na Ucrânia, há anos sob comando da Rússia, passa violentamente aos Estados Unidos, sob viés de adesão do país à OTAN, mantendo política de repressão aos direitos democráticos do povo ucraniano, e na prática aplicando medidas para isolar militarmente a potência russa.

Por anos, desde o Euromaidan, as tensões entre Rússia e OTAN vão se acirrando mais profundamente, como demonstrado na invasão à Crimeia por parte da Rússia, e o acirramento da disputa diplomática entre as duas potências, passando mais ao caráter militar da disputa, em que as duas potências justificam a intervenção alheia para legitimar a sua. O cenário que faz a agressão explodir na Ucrânia tem relação intrínseca com profunda crise econômica e política no sistema internacional, que leva a outro patamar as disputas entre potências por áreas de influência, motivo que intensifica a agressão da Rússia a nação ucraniana.

No esteio do conflito, três posições teóricas se delineam: a que define o conflito enquanto produto exclusivo da agressão imperialista russa; a posição que denuncia como imperialista unicamente a chantagem do bloco EUA – OTAN; e a que classifica o conflito enquanto interimperialista. Dentre a discussão sobre o caráter da guerra na Ucrânia, se faz importante expandir as três posições.

DIVISÃO TEÓRICA

Com relação a primeira, geralmente as análises tendem a classificar imperialismo enquanto política de governo, e atitude pessoal de governante. Por isso, muitas das vezes, a facilidade em nomear Putin enquanto autoritário e os EUA/OTAN enquanto democratas, dado a forma de organização do Estado burguês das duas nações. Apesar de tal posição hegemônica, reconhecer o imperialismo russo não é impeditivo de reconhecer o imperialismo dos EUA, e a disputa entre os dois blocos como o motivo para a agressão à Ucrânia.

Nesse ponto, há uma perspectiva histórica de denotar uma essência belicista/militarista do Estado russo enquanto parte de sua formação (SEGRILLO, 2022): ou seja, culturalmente, a Rússia enquanto nação tem como parte de seus costumes a ideia de que os territórios da antiga ‘Rus’ são parte de uma mesma comunidade, que dá margem a tendência anexionista do Estado russo.

Há, portanto, a visão acerca da possibilidade de projeção global do conflito, centrado na desglobalização, remilitarização de países-chave do sistema internacional, como os mais influentes da OTAN; e como ponto central, as sanções impostas a um país que trava uma guerra unilateral de agressão, dada a necessidade de subordinação do território ucraniano como parte da política de Estado russo (LOUREIRO, 2022).

Já no segundo campo teórico, parte-se do paradigma de que, enquanto os Estados Unidos agem com hegemonia no sistema internacional, as potências de menor força de projeção, ao invés de disputar a influência do capital dos Estados Unidos, travam guerras única e exclusivamente defensivas. No caso da guerra de agressão, tal posição vai de encontro à Rússia, que estaria travando, segundo a visão dos autores desse campo, uma guerra em defesa da Ucrânia, como também da própria soberania russa. Logo, a principal lógica desse marco é a de definir imperialismo como exclusivamente as ações dos Estados Unidos e seus sócios-menores na OTAN.

Nesse plano, o sentido histórico de imperialismo tendo como carro-chefe a visão leninista sobre o tema, perde seu sentido (BARREIRA, 2022), já que o bloco liderado pelos Estados Unidos tem sua hegemonia inconteste por décadas, inclusive de narrativas e que, apesar de sua perda de fôlego, países que disputam seu poder no sistema internacional estão muito atrasados na corrida pela transição hegemônica, como Rússia e China.

A principal crítica desse campo se dá a hegemonia nuclear inconteste do bloco da Otan, comandado pelo imperialismo norte-americano, que torna um embate entre potências de menor escalão como algo impossível (QUARTIM DE MORAES, 2022), relegando-as a ‘se dobrar ou resistir’. Além disso, há menção ao cinismo midiático ocidental, no sentido de exclamar os horrores da guerra travada no ‘oriente’, com dedo do ocidente, enquanto as intervenções do imperialismo no quintal Ocidental -América Latina, por exemplo-, são tratadas pelo mesmo monopólio de mídia enquanto ‘pela paz e democracia’.

Portanto, em um mundo que percebe de forma cada vez mais latente a crise da hegemonia unipolar dos Estados Unidos, Rússia e China aparecem ambos como contraponto ao “expansionismo ocidental”, tanto no Leste Europeu, como no Oriente Médio e na Ásia, tendo na Rússia o potencial militar, e na China o potencial financeiro. Nesse sentido, a Rússia trava uma espécie de ‘guerra de reconquista’ ao território da antiga URSS (ROSEIRA, 2023).

Para autores do campo, portanto, a Rússia trava uma guerra defensiva, contra o expansionismo da OTAN, este que joga para isolar tanto Rússia como China no jogo internacional. Desa maneira, tanto Rússia como China são países que não escolheram as condições da seara de disputa internacional, dada a ‘hegemonia absoluta’ dos Estados Unidos, mas sobrevivem enquanto Estados em ascensão, porém muito atrás do poderio econômico e militar da potência hegemônica.

Logo, no máximo, a Rússia, em sua ‘guerra defensiva’, estaria adotando posição anti-imperialista, ou ‘contraimperialista’ (BUGIATO, 2023) contestando-se o desenvolvimento do capitalismo da Rússia, ou seja, um ator que resiste com as armas que dispõe, expandindo-se para defender o ‘desenvolvimento nacional autônomo’.

O terceiro campo analisa a situação enquanto da posição de soberania da Ucrânia que, independentemente de qual país está dominando a nação, o conflito significa submissão doa nação e povo à alguma potência econômica e militar, campo analítico que se aproxima da visão leninista de interimperialismo. Logo, a guerra é motivada pela disputa entre jogadores grandes no sistema internacional.

Autores do campo procuram uma visão diferente dos monopólios de mídia, que tendem a condenar unilateralmente Putin. A guerra na Ucrânia, dentro desse campo teórico, representa a disputa entre duas potências militares (KONICZ, 2022) em que o imperialismo russo usa da antiga influência atômica da União Soviética para formar um território de amortecedor com Estados neutros, para frear o avanço dos Estados Unidos e OTAN no Leste Europeu.

Do outro lado, o imperialismo estadunidense mantém a narrativa de “democratizar” os países do leste europeu, como parte da legitimação de sua disputa por áreas de influência, enquanto pugna para minar a influência russa na região.

Como característica da opressão nacional, ambos Estados imperialistas, apesar da diferença de robustez entre o aparato financeiro dos Estados Unidos e Rússia,  armam movimentos nacionalistas contra a libertação nacional dos povos oprimidos pelo imperialismo, como o apoio do Estado russo a guerra de opressão da Turquia à luta do povo curdo; e o financiamento dos Estados Unidos ao Estado de Israel, no Oriente Médio, juntamente com a opressão ao povo árabe, principalmente na região da Palestina ocupada (CAMPOS, 2023).

A estratégia da Rússia em relação à auto-administração democrática de base em Rojava, no norte da Síria, não é diferente da adotada pelo governo Trump: em 2018, Putin deu carta branca a Turquia para conquistar e limpar etnicamente o cantão curdo de Afrin por causa de cálculos geopolíticos. Trump agiu de forma semelhante na Rojava ocidental um ano depois (CAMPOS, 2023).

Logo, característica marcante do imperialismo, compartilhada por ambos os países em conflito indireto na Ucrânia, se faz presente no aquecimento do capital monopolista militar, e sua exportação como forma de garantir outros financiamentos, principalmente no que tange à tomada de postos de produção de petróleo e gás, como acontece no Oriente Médio Ampliado e no Leste Europeu.

IMPERIALISMO E GUERRA

Financeiramente, em comparação com a potência hegemônica Estados Unidos, a Rússia é um país incipiente, porém se marca pelo imperialismo por conta de aparato militar bastante sofisticado, que aquece a exportação de capital, principalmente em investimento de petróleo e gás em países do Oriente Médio Ampliado, como Síria, e a participação de capital monopolista de mercenários, como o Grupo Wagner, em apoio a países que fazem parte da esfera de influência do imperialismo russo (CAMPOS, 2023).

Porém, o conflito se caracteriza enquanto interimperialista pois, apesar da diferença de robustez do capital financeiro, ambos Estados centrais do conflito -Estados Unidos e Rússia- são regidos pelo capital monopolista em tal quantidade que possibilitam a exportação de capital, com consequência tanto econômica como política, tendo como base a oligarquia financeira de cada país; dessa forma, aplicando a dominação e opressão de outras nações sob regime de dependência, semicolonial, ou mesmo por área de influência, garantindo assim a disputa pelo lucro máximo entre as potências imperialistas (LÊNIN, 1917).

Estas disputas mais abertas pela partilha do mundo representam o grau de crise em que se afunda o imperialismo nos dias atuais, lançando-se mais à guerra como única saída da queda relativa da taxa de lucro, e para conter as crises de superprodução, atiça as três contradições fundamentais do imperialismo: a principal, que opõe nações e povos oprimidos a países imperialistas; a que configura as disputas interimperialistas; e a que antagoniza o proletariado, de um lado, e a burguesia, de outro (LÊNIN, 1917).

Interessante notar que, ao atacar uns aos outros, os imperialistas revelam verdades sobre si mesmos: aos EUA, desmoraliza o já putrefato argumento de intervenção internacional ‘pela democracia’: se antes reservada ao financiamento de grupos extremistas religiosos, nos últimos tempos com a formação e estruturação de grupos neonazistas principalmente no Leste Europeu, esta estratégia deixa mais clara a face vampiresca da potência hegemônica para manter a lei do lucro máximo de pé para os monopólios americanos.

De outro lado, há a denúncia russa aos Estados Unidos e o discurso de “guerra antifascista” travada pelo Kremlin, enquanto também exporta a guerra para outros países que desafiam a dominação russa em seu solo, como o Grupo Wagner no Oriente Médio Ampliado (CAMPOS, 2023). Além disso, contrapondo novamente discurso com prática, Putin em solo nacional persegue grupos e organizações progressistas ou revolucionárias, pondo freios pesados à luta popular.

 Ao fim e ao cabo, tanto a narrativa de ‘desnazificação’ como o chamado ao retorno à ‘Rus’ se mostram como formas de legitimar a agressão à Ucrânia pela retomada do bastão de mando russo da região, haja vista a importância de manter a Ucrânia sob influência russa, tanto por objetivo militar de manter zona de amortecimento aos avanços da OTAN, como também de deter porção da produção e escoamento de gás da nação ucraniana.

As narrativas nesse teor também são sinais dos tempos em que a competição do imperialismo russo se torna mais direta com o imperialismo estadunidense, usada também ao legitimar o apoio à Turquia na guerra de limpeza étnica aos povos turco e armeno; como também para oprimir o próprio proletariado russo (KONICZ, 2022).

Economicamente, a Rússia também mostra um robusto aparato monopolista militar[1], como também aeroespacial e automobilístico (OICA, 2023), ramos que ocupam grande parte do PIB destinado à grande indústria.

De fato, ambos lados mostram comoção com a Ucrânia, mas apenas para mostrar as lágrimas de crocodilo e tentar disfarçar o imperialismo por meio de discursos já há muito desmoralizados.

A Rússia, enquanto potência atômica, em comparação ao período das duas grandes guerras mundiais, ocupa o papel da Alemanha, ou seja, de desestabilizar a potência hegemônica – antes Inglaterra; depois da Segunda Guerra, Estados Unidos – (CAMPOS, 2023), em momento em que a mesma está em aberta decadência: há a disputa interimperialista entre EUA e China na região do mar da China; o conflito secular que se intensifica na região da Palestina ocupada e que, durante a escrita do artigo, dá mostras de acirramento na forma de regionalização do conflito, em defesa da Palestina e rechaço ao Estado de Israel, como sócio do imperialismo estadunidense; o conflito na Ucrânia; e o caos social que toma a América Latina, principal quintal dos Estados Unidos.

A disputa mais exacerbada pelo lucro máximo, acirra cada vez mais a opressão a países dominados pelo imperialismo, intensifica a disputa interimperialista, e, consequentemente também o descrédito à ordem de democracia liberal-burguesa, não à toa o fascismo aparece novamente na ordem do dia, como anteparo último à luta do proletariado e dos povos por libertação, sendo o fascismo a fração mais reacionária da burguesia imperialista, logo, mais consequente em aplicar a violência reacionária da mais aberta.

A tendência no sistema internacional é o da violência política reacionária em toda ordem que tende a se prolongar, fruto da reação política em toda linha como tendência do imperialismo (LÊNIN, 1916), como tentativa de frear a radicalização da luta dos povos do mundo.

Apesar das tensões de guerra e a tendência à Terceira Guerra Mundial, estas caminham lentamente a essa perspectiva, calculada que é pelas potências imperialistas: da necessidade do imperialismo estadunidense e de países da OTAN de neutralizar antes o poderio nuclear russo ao máximo; e da necessidade de manter as áreas de influência por parte do imperialismo russo.

Economicamente, as sanções impostas pela OTAN à Rússia não cumpriram o objetivo estratégico de arrefecer a ofensiva militar russa. Com a finalidade de frear o aquecimento do complexo industrial militar russo, as sanções à exportação de petróleo e gás, segundo análises de institutos econômicos, representavam perspectiva de crescimento negativo do PIB russo no período inicial da guerra na Ucrânia. Porém, as sanções fizeram aumentar a inflação na União Europeia, dado o imperialismo russo enquanto principal exportador energético para os países signatários do bloco econômico (IPEA, 2022-2023).

 Indicativos de desaceleração do PIB russo, logo após as sanções, também não previram a diversificação da exportação de petróleo e gás para países como Índia e China, como também se tornam diversos os parceiros econômicos, o que diminui a oferta para os países-chave da União Europeia, e mostra um efeito colateral que estimula o compromisso desses atores com a guerra e financiamento em defesa para frear a crise econômica que se aprofunda em solo nacional (IPEA, 2022-2023).

Os dados econômicos também demonstram que sanções não causaram efeito esperado na potência atômica Rússia já que, por deter monopólios de produção estratégicos para a economia mundial, consegue facilmente diversificar o comércio, assim, não percebe tanta influência da exportação de capital como os países semicoloniais sofrem, logo, também não recebe em mesma proporção as imposições políticas dos tratados impostos pelas Organizações Internacionais capitaneadas pela potência hegemônica Estados Unidos, dado que mostra que, não sendo um país dependente, é também um país que domina nações e povos do mundo, em sua região.

O que se percebe, portanto, é que a solução militar ao imperialismo torna-se a única saída no período corrente de decadência geral do sistema, dado que tanto a diplomacia se militariza, quanto a guerra econômica se torna cada vez mais estreita. Exemplo disso é o aumento em investimento militar[2] em países-chave da União Europeia, elevadas as tensões após da diplomacia de guerra e o fracasso dos objetivos das sanções ao imperialismo russo.

A guerra caminha a passos curtos, com a tendência ao cumprimento dos objetivos mínimos por parte do imperialismo russo: o arrefecimento das tensões de guerra e a formalização da anexação na região do Donbass.

Historicamente, as Guerras Mundiais tiveram um papel parcial de impulsão das Revoluções; a Primeira Guerra, que impulsionou a Revolução Russa no campo internacional, pela consigna de “transformar a guerra imperialista em guerra civil revolucionária”; e a conclusão da Segunda Guerra, que acelera formação de um sólido campo socialista, liderado pela Revolução Chinesa.

Também como resultado do manejo de grandes líderes revolucionários, como Lênin, Stalin e Mao Tse-tung, os períodos de guerra interimperialista põem mais em claro o grau de decrepitude do sistema imperialista, que por necessidade de se manter de pé, lança mais guerra, mais opressão ao proletariado e povos do mundo, com mais desemprego, fome, miséria, pelo grau de disputa das potências pela expansão da exportação de capital dos respectivos países imperialistas.

Logo, os cálculos dos imperialistas seria o de desatar um terceiro conflito mundial apenas com a tendência de vitória assegurada, dado que cada passo do imperialismo em momentos de profunda crise, deixa mais claro os sinais de sua profunda fragilidade, e, tal como percebido na radicalização da luta de libertação do povo palestino, atiça a Revolução Proletária.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pode-se entender, pela exposição presente nesse artigo, que um conflito como o presente principalmente em território da Ucrânia, envolvendo as potências no cenário internacional, não somente é paradigmático para as Relações Internacionais, como mobiliza ampla gama de estudos sobre o tema, tendo no campo teórico sobre o imperialismo o foco do texto.

Apesar das diferenças percebidas no conteúdo das três posições teóricas demarcadas e observadas, percebe-se os esforços de estudiosos e especialistas de tentar entender e agir num período histórico tão turbulento quanto o presente, marcados por cataclismos comerciais e financeiros, além do agravamento da política internacional como um todo, marcado por guerras e as tensões caracterizadas pela guinada à extrema-direita no cenário das nações, e pelo agravamento do intervencionismo sempre latente das potências imperialistas na seara internacional.

A partir do exposto, entende-se a faísca que se acende em acúmulo a decomposição do sistema imperialista como um todo, que para se manter de pé, acelera as futuras crises, até sua derrocada pela transformação social e destruição do “antigo regime”, seja comandado pela hegemonia do imperialismo estadunidense, ou futuramente por outra potência imperialista, enquanto possibilidade. Ao fim das contas, não existe ‘imperialismo benigno’, mesmo que se apresente pela forma enquanto contraponto à potência hegemônica.

A máquina econômica e política de exploração e opressão da esmagadora maioria da humanidade, ou seja, do proletariado e povos do mundo, continua a funcionar fomentando guerra, carestia, adoecimento e desemprego, independente de quem a esteja operando, até que ela seja destruída pela potência transformadora de quem o aparato imperialista se alimenta.

Dessa forma, a compreensão do conceito de imperialismo se revela fundamental para a análise da concretude das relações internacionais, como mostra o caso da Guerra na Ucrânia.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

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[1]Disponível em: <https://www.sipri.org/visualizations/2023/sipri-top-100-arms-producing-and-military-services-companies-world-2022>

[2]Disponível em: <https://oglobo.globo.com/mundo/noticia/2023/01/franca-eleva-seu-orcamento-militar-em-mais-a-medida-que-aumenta-o-risco-de-guerra.ghtml>; <https://www.sabado.pt/europa-viva/detalhe/despesas-militares-subiram-na-uniao-europeia-e-nato>.

Resumo

O conflito corrente na Ucrânia, iniciado nos moldes atuais há mais de dois anos, possui uma carga histórica muito expressiva, e é paradigmática sua discussão no campo das Relações Internacionais. O acirramento da guerra mostra-se enquanto acontecimento de grande impacto no mundo, por conta de suas consequências geopolíticas, trazendo à tona o importante debate teórico sobre imperialismo. Dentre as possíveis interpretações, há de se ressaltar três: uma, que classifica unilateralmente a Rússia enquanto imperialista; a segunda, que denuncia unicamente a agressão enquanto imperialista pelo lado dos EUA – OTAN; e a terceira, que se aproxima da percepção de conflito interimperialista. Dessa forma, as contribuições presentes no artigo se valem enquanto acúmulo para discussão tão importante e atual no século XXI: o desenvolvimento – e decadência- do sistema imperialista, a partir do conceito de imperialismo e de suas diferentes interpretações, intentando resumir o panorama das teorias acerca do conflito.

Palavras-chave: imperialismo; guerra; Ucrânia; Rússia; Estados Unidos.

Abstract

The current conflict in Ukraine, which began in its current form more than two years ago, has a very significant historical significance, and its discussion in the field of International Relations is paradigmatic. The escalation of the war has been seen as an event with a major impact on the world, due to its geopolitical consequences, bringing to the fore an important theoretical debate on imperialism. Among the possible interpretations, three stand out: one, which unilaterally classifies Russia as imperialist; the second, which denounces only the aggression as imperialist on the part of the United States – NATO; and the third, which comes close to the perception of an inter-imperialist conflict. Thus, the contributions presented in the article serve as a basis for such an important and current discussion in the 21st century: the development – and decline – of the imperialist system, based on the concept of imperialism and its different interpretations, attempting to summarize the panorama of theories about the conflict.

Keywords: imperialism; war; Ukraine; Russia; United States.

Gabriel Claudemiro Farias de Souza é graduando em Relações Internacionais na UFRRJ e Bolsista de Iniciação Científica PIBIC/CNPq

Luiz Felipe Brandão Osório é professor de Relações Internacionais e do Programa de Pós-Graduação de Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade (CPDA) da UFRRJ e do Programa de Pós-Graduação em Economia Política Internacional (PEPI) da UFRJ. Vice-Diretor do Instituto de Ciências Humanas e Sociais (ICHS/UFRRJ). Pós-Doutor em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie/SP (2016). Doutor e Mestre em Economia Política Internacional pela UFRJ. Graduação em Direito pela UFJF. Autor do livro Imperialismo, Estado e Relações Internacionais, pela Editora Ideias & Letras. Pesquisador do GT CLACSO Pensamento Jurídico Crítico, do NIEP-Marx/UFF e do Laboratório Interdisciplinar de Estudos em Relações Internacionais (LIERI-UFRRJ). Tem experiência de cátedra e pesquisa nas áreas de Relações Internacionais, Ciência Política, Economia Política Internacional, Organizações Internacionais, Integração Regional, Direito Internacional, Direitos Humanos e Teoria do Direito

Diálogos Internacionais

Divulgação científica de Relações Internacionais, Defesa e Economia Política Internacional ISSN 2596 2353